dissertação, artigo e trabalhos pra escrever. Mas bom
mesmo é escrever no blog.
Nosso plano de saúde vence em 15 dias, então hoje fui ao
médico pela primeira vez aqui nesta terra esquisita. Oftalmologista. Virei uma
pessoa dependente que precisa de marido até pra marcar um raio de médico.
Acontece que o marido marcou pra um horário ruim. Desafiei meu alemão precário
e bem liguei pro consultório, pedindo pra ir hoje: “Augenartzpraxis, klinisssshhh
rarsh errish larchhh Doktor rashhhhhhrrrressssrrrossssssssssshhhhhhhh, Guten
Tag” – a secretária proferiu quase 5 minutos de Rs apenas ao atender o telefone
e identificar que se tratava de uma clínica oftalmológica. Logo mandei um “Sprechen
Sie Englisch?” Não, ela disse que o Englisch dela era “schlecht”. Então disse
que o meu alemão também era e milagrosamente consegui explicar pra ela que
tinha consulta pra amanhã mas que gostaria de ir hoje. Super gentil, ela me
disse que eu poderia ir e mais um monte de outras coisas que não entendi!
Desliguei explicando que não tinha entendido nada além da parte de que eu podia
ir, então que estava chegando lá. No caminho, um egípcio, pra quem pedi
informação resolveu me levar lá. Estava tão decidido a ir até o médico comigo
que até me pediu pra esperar um pouco pra ele ir ao banco. Argumentei que já
estávamos na rua certa, que ele já tinha sido muito gentil e que agora,
procurar o número era fácil, mas ele insistiu que voltava logo. Fiquei meio
desconfiada, mas obedeci. Chegando à porta da clínica, tive que dispensar o
simpático, que parecia querer subir comigo e participar da consulta. Custei a
desvendar qual das 58 placas na entrada era referente à clínica que eu
procurava para identificar o andar (os endereços aqui nunca incluem o
apartamento ou a sala. É preciso ver pelos sobrenomes, escritos no térreo).
Acontece que o sobrenome da médica que eu procurava constava lá como homeopata
e não como oftalmologista. Chegando, toquei a campanhia e esperei longamente.
Toquei de novo e nada. Até que chegaram duas senhoras que imediatamente
empurraram a porta e entraram. Ri, dizendo que não sabia que era só entrar, mas
ninguém mais riu. A secretária estava altamente enrolada, digitando ferozmente
algo no computador e xingando cada telefonema que tocava fazendo sons
diferentes na recepção (um deles era uma musiquinha irritante). Até que veio
outra secretária, simpática, que felizmente falava um pouco de inglês. Logo
quis ficar com meus óculos e tive que explicar que não era possível, pois sem
eles não conseguiria chegar nem à cadeira da sala de espera. Perguntou de onde
eu era, sorrindo quando respondi, e logo em seguida perguntando também se eu ia
pagar (!) Mostrei-lhe o papel do plano de saúde, que ela olhou estranhamente,
como se não conhecesse. Perguntei se não aceitava tal plano e ela foi incisiva:
“claro, natürlich”; eu hein! Em seguida me chamou na sala de espera com uma
pronúncia que não poderia identificar que se tratasse do meu sobrenome (aqui
não existe chamar ninguém pelo primeiro nome). E olha que meu sobrenome é
alemão! Falou mais alto e mudou a pronúncia, aí sim me identifiquei e ela riu. Voltei
pro balcão de recepção e o telefone continuava agitado. A secretária gargalhava
com a outra, dizendo à pessoa que tinha ligado que ela podia ir ao salão, mas
que se fosse lavar o cabelo, não podia molhar os olhos. “Não, maquiagem deve
evitar na área dos olhos”, “sim, pode vir a pé para o médico, não tem problema
caminhar” e por fim: “então faz o seguinte, senhora: fica com o dia livre
amanhã, vai pro seu salão, aproveita seu fim de semana e vem fazer a cirurgia só
na segunda”. A outra chorava de rir, fazendo gestos de como ela lavaria o
cabelo sem molhar os olhos e como se maquiaria. A própria secretária foi fazer
meu exame de vista. Dizem que aqui na Alemanha é assim – o médico só chega no
fim pra carimbar e assinar o trabalho dos enfermeiros. Em 1 minuto a maquininha
disse, sem eu precisar ficar cantando letras e números cada vez menores, meu
grau. Acontece que surgiu um número abaixo do da minha lente atual, com a qual
enxergo cada vez pior. Expliquei-lhe que, apesar de eu estar velha pra essas
coisas, minha pele e minha vista funcionam como as de uma adolescente e que eu
tinha certeza de que meu grau tinha aumentado em relação ao meu último exame
embora o grau que ela tivesse encontrado fosse abaixo do que uso atualmente. Ela
estranhou, mas disse que ia conversar com a médica. Aí perguntou pra outra
secretária se a médica falava inglês e se mostrou preocupada de ouvir que não.
Achei então que ela explicaria previamente a situação, mas eis que depois de
mais uma longa espera, quando a tal médica me chama, não sabia do que se tratava o meu "caso", além de não
falar nem inglês, nem francês e nem um alemão claro, pois ela também é
estrangeira e tem um alemão carregado na pronúncia! (aqui grande parte dos
médicos é estrangeira, pois curiosamente não é um bom salário e os alemães acabam
raramente fazendo medicina). Chuto que ela era romena, só sei que os milhares
de Rs do alemão eram ditos por ela com a língua no céu da boca, em vez do R
forte, como os nossos 2 Rs. Bom, acho até que fui bem ao explicar novamente
toda novela da minha suspeita de que meu
grau havia aumentado e de que tudo o que eu precisava era de uma receita
atualizada para comprar lentes. Difícil foi entender o que ela disse: não sei
se ela explicou que é normal ainda na minha idade ter aumento de grau ou se era
que a diminuição do grau poderia gerar desconforto na visão também. Só sei que
foi hilário ficar chorando ao fazer o esforço de acompanhar com os olhos uma luzinha
chata em vez de olhar em direção à orelha da médica, como era a orientação! Ler as letras e os números foi fácil, difícil
foi entender que, neste país das regras, ela não podia me dar uma receita pra
lentes e sim pra óculos. Quem faz a validação da receita pra lentes é a ótica e
bastava, portanto, eu ir até a ótica mais próxima!
Legal, Maria, este relato que nos leva para esta experiência em uma clínica médica junto com você.
ResponderExcluirDos barulhos - dos toques do telefone, das secretárias, dos rrss do alemão - às placas de identificação no térreo, tudo muito vivo.
Nos oferece uma bela espiada nesta cultura germânica atual.
Obrigada.
Oba! foi.
ResponderExcluir