quinta-feira, 15 de março de 2012

oftalmologista


dissertação, artigo e trabalhos pra escrever. Mas bom mesmo é escrever no blog.

Nosso plano de saúde vence em 15 dias, então hoje fui ao médico pela primeira vez aqui nesta terra esquisita. Oftalmologista. Virei uma pessoa dependente que precisa de marido até pra marcar um raio de médico. Acontece que o marido marcou pra um horário ruim. Desafiei meu alemão precário e bem liguei pro consultório, pedindo pra ir hoje: “Augenartzpraxis, klinisssshhh rarsh errish larchhh Doktor rashhhhhhrrrressssrrrossssssssssshhhhhhhh, Guten Tag” – a secretária proferiu quase 5 minutos de Rs apenas ao atender o telefone e identificar que se tratava de uma clínica oftalmológica. Logo mandei um “Sprechen Sie Englisch?” Não, ela disse que o Englisch dela era “schlecht”. Então disse que o meu alemão também era e milagrosamente consegui explicar pra ela que tinha consulta pra amanhã mas que gostaria de ir hoje. Super gentil, ela me disse que eu poderia ir e mais um monte de outras coisas que não entendi! Desliguei explicando que não tinha entendido nada além da parte de que eu podia ir, então que estava chegando lá. No caminho, um egípcio, pra quem pedi informação resolveu me levar lá. Estava tão decidido a ir até o médico comigo que até me pediu pra esperar um pouco pra ele ir ao banco. Argumentei que já estávamos na rua certa, que ele já tinha sido muito gentil e que agora, procurar o número era fácil, mas ele insistiu que voltava logo. Fiquei meio desconfiada, mas obedeci. Chegando à porta da clínica, tive que dispensar o simpático, que parecia querer subir comigo e participar da consulta. Custei a desvendar qual das 58 placas na entrada era referente à clínica que eu procurava para identificar o andar (os endereços aqui nunca incluem o apartamento ou a sala. É preciso ver pelos sobrenomes, escritos no térreo). Acontece que o sobrenome da médica que eu procurava constava lá como homeopata e não como oftalmologista. Chegando, toquei a campanhia e esperei longamente. Toquei de novo e nada. Até que chegaram duas senhoras que imediatamente empurraram a porta e entraram. Ri, dizendo que não sabia que era só entrar, mas ninguém mais riu. A secretária estava altamente enrolada, digitando ferozmente algo no computador e xingando cada telefonema que tocava fazendo sons diferentes na recepção (um deles era uma musiquinha irritante). Até que veio outra secretária, simpática, que felizmente falava um pouco de inglês. Logo quis ficar com meus óculos e tive que explicar que não era possível, pois sem eles não conseguiria chegar nem à cadeira da sala de espera. Perguntou de onde eu era, sorrindo quando respondi, e logo em seguida perguntando também se eu ia pagar (!) Mostrei-lhe o papel do plano de saúde, que ela olhou estranhamente, como se não conhecesse. Perguntei se não aceitava tal plano e ela foi incisiva: “claro, natürlich”; eu hein! Em seguida me chamou na sala de espera com uma pronúncia que não poderia identificar que se tratasse do meu sobrenome (aqui não existe chamar ninguém pelo primeiro nome). E olha que meu sobrenome é alemão! Falou mais alto e mudou a pronúncia, aí sim me identifiquei e ela riu. Voltei pro balcão de recepção e o telefone continuava agitado. A secretária gargalhava com a outra, dizendo à pessoa que tinha ligado que ela podia ir ao salão, mas que se fosse lavar o cabelo, não podia molhar os olhos. “Não, maquiagem deve evitar na área dos olhos”, “sim, pode vir a pé para o médico, não tem problema caminhar” e por fim: “então faz o seguinte, senhora: fica com o dia livre amanhã, vai pro seu salão, aproveita seu fim de semana e vem fazer a cirurgia só na segunda”. A outra chorava de rir, fazendo gestos de como ela lavaria o cabelo sem molhar os olhos e como se maquiaria. A própria secretária foi fazer meu exame de vista. Dizem que aqui na Alemanha é assim – o médico só chega no fim pra carimbar e assinar o trabalho dos enfermeiros. Em 1 minuto a maquininha disse, sem eu precisar ficar cantando letras e números cada vez menores, meu grau. Acontece que surgiu um número abaixo do da minha lente atual, com a qual enxergo cada vez pior. Expliquei-lhe que, apesar de eu estar velha pra essas coisas, minha pele e minha vista funcionam como as de uma adolescente e que eu tinha certeza de que meu grau tinha aumentado em relação ao meu último exame embora o grau que ela tivesse encontrado fosse abaixo do que uso atualmente. Ela estranhou, mas disse que ia conversar com a médica. Aí perguntou pra outra secretária se a médica falava inglês e se mostrou preocupada de ouvir que não. Achei então que ela explicaria previamente a situação, mas eis que depois de mais uma longa espera, quando a tal médica me chama, não sabia do que se tratava o meu "caso", além de não falar nem inglês, nem francês e nem um alemão claro, pois ela também é estrangeira e tem um alemão carregado na pronúncia! (aqui grande parte dos médicos é estrangeira, pois curiosamente não é um bom salário e os alemães acabam raramente fazendo medicina). Chuto que ela era romena, só sei que os milhares de Rs do alemão eram ditos por ela com a língua no céu da boca, em vez do R forte, como os nossos 2 Rs. Bom, acho até que fui bem ao explicar novamente toda  novela da minha suspeita de que meu grau havia aumentado e de que tudo o que eu precisava era de uma receita atualizada para comprar lentes. Difícil foi entender o que ela disse: não sei se ela explicou que é normal ainda na minha idade ter aumento de grau ou se era que a diminuição do grau poderia gerar desconforto na visão também. Só sei que foi hilário ficar chorando ao fazer o esforço de acompanhar com os olhos uma luzinha chata em vez de olhar em direção à orelha da médica, como era a orientação!  Ler as letras e os números foi fácil, difícil foi entender que, neste país das regras, ela não podia me dar uma receita pra lentes e sim pra óculos. Quem faz a validação da receita pra lentes é a ótica e bastava, portanto, eu ir até a ótica mais próxima!

2 comentários:

  1. Legal, Maria, este relato que nos leva para esta experiência em uma clínica médica junto com você.
    Dos barulhos - dos toques do telefone, das secretárias, dos rrss do alemão - às placas de identificação no térreo, tudo muito vivo.
    Nos oferece uma bela espiada nesta cultura germânica atual.
    Obrigada.

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