quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

meu querido diário

esta é uma anotação de umas semanas atrás, que fiquei sem-graça de expor aqui. Aí aconteceu o que sempre acontece depois dos meus e-mails: com as respostas estimulantes eu perco a vergonha  e venho aqui me exibir pro mundo. Bom, voilà:



Sempre fui boa em dar sentido à vida. Lembro, eu ainda pequena, da minha mãe dizendo que eu era íntegra. Memória pelo menos parcialmente fantasiada, talvez, pois a resposta da qual lembro não é o que me parece definir integridade exatamente, mas mais essa minha característica: “É você entrar nas coisas por inteiro, se engajar”. Bom, pode ser isso mesmo, pois integridade não deixa de sê-lo e deve vir daí mesmo, de inteiro. Pois desde que meu senso auto-reflexivo se entende por gente, me sinto sortuda por uma boa cota de pulsão de vida que constitui minha natureza. De fato, costumo gostar, me envolver e fazer bem o que quer que eu faça. Faço laços facilmente vida afora. E eles me preenchem enormemente: família, trabalho, amigos, amor... Paradoxalmente, sinto-me, tantas vezes, também muito vazia. E se tenho o lado aberto, alegre e receptiva ao laço com o outro, sou ao mesmo tempo muito fechada, muito acomodada em mim-mesma.
Essa experiência de viver fora naturalmente ressalta essas características. É incrível como os dois lados da moeda me são intensos aqui: o enorme sentido de viver essa experiência riquíssima e o total vazio de estar aqui, tão longe de tudo que me dá sentido. São inúmeros os pontos favoráveis ao que viver aqui tem de enormemente construtivo: conhecer outras culturas, experimentar uma vida completamente diferente, estreitar profundamente meus laços com o Marco, aprender e curtir cuidar de uma casa (o que se desdobrou em cuidar também de outras), poder viajar muito pra vários países, aprender outras duas línguas, estudar, ter tempo livre, viver um outro ritmo. Mas estar longe de todos e do meu lugar social é também muitíssimo vazio. Aqui não sou ninguém, ninguém me conhece, não trabalho em nada relevante, não construí uma história, não tenho uma trajetória. E poderia fazer isso tudo, não facilmente, é claro, mas não tenho vontade. Estou absolutamente acomodada, recolhida, de férias. Dei-me conta do quanto não busco construir aqui as coisas que me dão sentido, do quanto vivo numa certa provisoriedade. É exatamente este o meu sentimento – de provisoriedade. E, se ao mesmo tempo, saber que isso é momentâneo me faz suportar estar tão distante de tudo que me constitui, é também o que me impede de buscar estar melhor.
Esses dias caiu esta importante ficha e tive vontade de não estar tão acomodada neste tempo até então meramente intervalar. A primeira reação foi começar uma dieta, visto que esta perspectiva de estar de férias até de me cuidar me fez engordar muito além dos limites. A idéia de investir mais no mestrado e passar a dar mais sentido à minha pesquisa, à possibilidade de estudar , também foi animadora inicialmente. Acontece que a empolgação não durou nada: o mestrado me é realmente algo quase sem sentido, não fosse a escrita da dissertação. Tá, não é pouca coisa fazer uma pesquisa que tenho vontade de fazer há tanto tempo e que tanto tem a ver com o meu trabalho, pro qual voltarei em breve com essa bagagem. Mas as aulas, a viagem de 5 horas quase que diariamente, e agora ter que encarar o frio polar pra assistir às disciplinas  que me lembram o primeiro período de psicologia é realmente algo que têm muito mais a função de me manter ocupada e sã do que me acrescentar algo, além do aprendizado do francês. Tive o azar enorme de encontrar um departamento em frangalhos, após um racha em que vários professores saíram e outros estão desmotivados e a organização está caótica, além de uma diretora narcisista ao extremo e que acredita que psicanálise é uma ciência dura!
Bom, resta-me investir em outra coisa que me é tão cara: laço social. Mas a verdade é que, pra além de toda a dificuldade de me aventurar nessa empreitada de fazer amigos na Alemanha, fica difícil constituir um lugar estando dividida entre dois países. Além disso, fizemos a escolha, super acertada, ao meu ver, de morar muito isolados, tendo a grande vantagem de ter uma casinha pra lá de especial. Sair não é só difícil pela distância da nossa casa da cidade e das opções de lazer, mas também pela falta de vontade de sair de uma casinha tão linda e gostosa. Então nos acomodamos nós dois, o que também é uma delícia, com nossas sessões de cinema de fim de semana e uma rotina de aulas, faxina, mercado etc. É bem verdade que tem as visitas, os projetos de viagem e tanta coisa ainda por vir.
É, e eu aqui reclamando da vida vazia... Acho que é isso que me mantém bem, que na verdade o buraco de dentro é cercado de tanta coisa boa que ele só se faz notar de vez em quando!

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

neste ovo que é o mundo


Conhecemos um casal brasileiro de musicólogos em uma cidezinha alemã de 88.000 habitantes. Logo no início da boa conversa, em que se identificavam várias coisas em comum, rola o seguinte diálogo:
Marco: ah, vocês são do sul? Conheço um pessoal do violão de lá, etc
Ela: você conhece o livro “A História do Violão”?
Marco: Claro! Do Norton Dudeque!
Ela, apontando pro namorado, como quem está apresentando: Norton Dudeque!


Em seguida, já dentro de uma boate, na mesma pequena cidade, outro diálogo:


um alemão: vocês são brasileiros?! Morei em Niterói um tempo.
Marco: sério? Eu sou de Niterói!
o alemão: que coincidência! Você faz o que?
Marco: sou músico
o alemão: nossa! Eu namorava a filha de uma cantora lá de Niterói, a Sônia Wegenast.
Marco: não brinca! Eu trabalhava com a Sônia!

outro imeiu


Queridos,
Ando querendo escrever, pois o último mail já foi há um tempo e mandar notícias é uma forma de administrar as saudades. Muitos de vocês têm também me cobrado as mensagens “enormes e divertidas”. Mas acontece que depois de um tempo aqui, as coisas deixam de ser novidade e o olhar de estranhamento, em que cada detalhe cotidiano vale ser narrado, vai se habituando.  Se por um lado fica tudo mais sem-graça, por outro, é incrível isso da gente se adaptar a situações as mais variadas e poder construir, desconstruir e reconstruir paradigmas ao longo da vida. Faz parte do processo incorporar os hábitos de uma outra cultura, que no início nos eram tão estranhos, e aí passar a questionar e estranhar padrões da nossa própria cultura, antes tão familiar. O negócio vai ser administrar pra sempre essa marca, que eu suponho que fique, de uma certa desterritorialização. Deve ser análoga a um processo de análise, que é algo que abre os horizontes de uma forma riquíssima, mas que, como me queixou uma amiga de forma muito pertinente uma vez, é irreversível e talvez fosse mais simples viver num campo de visão mais estreito.
Enfim, mó blá-blá-blá pra encher lingüiça, já que não tenho muito pra contar e estou com a capacidade narrativa completamente congelada neste frio polar horroroso! E eu que vinha comemorando um inverno especialmente ameno, em que não tinha nem temperatura negativa nem neve, fui surpreendida com quase 3 semanas de sensação térmica chegando a -20 graus. Bom, eu paniquei, reclamei à beça, fiz drama dizendo que isso não era vida, que seria impossível tocar a minha rotina simples de trocar de trem, andar 10 minutinhos pra pegar um bonde ou ir pro curso de francês. Mas a verdade é que, apesar de ser bem desagradável, não faz tanta diferença assim em relação a uns -5 graus, que suponho que seja uma temperatura normal de inverno europeu. Hoje está -1, finalmente nevando bem, e eu estou surpresa com minha sensação de que está super agradável este “calorzinho”!!
Tô aqui fugindo das notícias mais pragmáticas porque elas são chatíssimas. Eu estou detestando e mestrado e me pergunto repetidamente o que estou fazendo lá. Fui parar num departamento pós-crise, que está ainda se recompondo de um racha onde saíram os professores mais interessantes, parece. A diretora atual é uma vaca arrogante que acredita que psicanálise é ciência exata e que precisamos usar instrumentos tais como testes psicológicos pra “verificar” as nossas hipóteses! Algumas aulas me lembram o primeiro período da faculdade. Mas, foi a possibilidade que rolou de voltar a estudar de forma mais sistemática, acho que é fundamental  me manter ocupada, é uma carta na manga pra volta, tem o bônus da língua e, principalmente, escrever a dissertação é algo que, embora me seja muito sofrido, faz todo o sentido pra mim! Pelo menos tive a sorte de pegar uma orientadora legal e poder pesquisar exatamente o que eu queria. E também é um mestrado-relâmpago este, que termina em menos de 1 ano, e eu já estou na reta final. E depois, é só alegria. Verão, visitas mais que  esperadas, viagens mil, estágio em La Borde!! Então é aproveitar antes que acabe essas “férias prolongadas”, que é o que me parece essa experiência aqui!
Bom, é isso. Quero notícias quentinhas de vocês também.
Beijo enorme

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

bobinha


AMO
Nossa casinha
Não ter violência aqui
As mil possibilidades de viagens
A vida tranqüila

ODEIO
A vida tranqüila
O frio
Não ser ninguém aqui 
A saudade