domingo, 24 de julho de 2011

Ich liebe Deutschland


Hoje comemoro 4 meses de Alemanha. Que louco! Ao mesmo tempo que passou muito rápido, parece que minha tão cara vidinha brasileira está num passado meio longínquo... Já me sinto em casa aqui, é como se cada vez menos estrangeira eu fosse. Aos poucos, a cultura alemã nos é tão familiar que já nos acostumamos com o que antes causava tanta estranheza. Acho que, nesse sentido, o que merece mais destaque é a total quebra dos estereótipos que tínhamos. Pra começar, os alemães, pelo menos os daqui do sul, não são, de maneira geral, nem altos, nem louros (naturais, porque, curiosamente a maioria das mulheres pinta o cabelo de louro claro). Alguns dos apartamentos que visitamos no início foram descartados porque simplesmente nós dois (tudo bem, muito altos para os padrões brasileiros, mas para os alemães também!) não cabíamos debaixo do chuveiro, ou mesmo para lavar louça, por o teto ser muito baixo! Mesmo aqui na nossa “mansão”, que é sótão, muitas vezes batemos a cabeça nas quinas do teto até nos acostumar. Outro ponto que muito me intrigou é que os alemães, que, são, sim, muito organizados em alguns aspectos, são às vezes tão caóticos e burrocráticos como nós. Na prefeitura onde nos registramos, foi um problemão para eu conseguir minha permissão de residência: mesmo com toda a documentação do DAAD (programa de intercâmbio do Marco, que é vinculado ao consulado e que estimula também a vinda de cônjuges) e com todas as orientações, tivemos que voltar lá 7 vezes e a cada ida, a funcionária dava uma informação diferente, uma nova exigência que me impedia de conseguir o visto! Tivemos que, com o nosso jeitinho brasileiro, pedir a intervenção da pessoa responsável pela bolsa do Marco! Não houve um contrato que assinamos aqui (telefonia móvel, internet, aluguel, academia) que não tenha nos dado a maior dor de cabeça. Pra começar, ao contratar qualquer serviço aqui, você precisa dar os dados bancários e a cobrança é feita sempre em débito automático, sem sequer se receber um boleto ou uma conta! Em todos os casos listados acima, tivemos problemas: todas as prestadoras de serviço cobraram a mais ou por mais tempo, mesmo depois de termos cancelado o contrato, e pra resolver esses problemas aqui é igualzinho ao Brasil: horas de telefonemas, funcionários incompetentes, informações não registradas, com o agravante de que a gente não tem telefone fixo e todas essas ligações, feitas de celular, são caras, mesmo quando é pra própria operadora! O nosso primeiro contrato de aluguel, então, está sendo o maior problema. Depois do babaca do proprietário do nosso antigo apartamento entrar daquele jeito, ditando regras sobre como deveríamos arrumar a “nossa” casa, finalmente finalizamos o contrato na data prevista e até agora, quase um mês depois, não recebemos de volta os 540 euros da caução (aqui paga-se, além de uma taxa alta de porcentagem para a imobiliária, caso se tenha fechado um contrato de aluguel com corretor, um caução para garantir o custo de quaisquer danos feitos no apartamento). Bom, os serviços aqui são super precários, é algo inacreditável. Já escrevi sobre como são ineficientes, por exemplo, os tais corretores, que recebem o valor de cerca de 3 alugueis (uma média de 1500 euros!) pelo “trabalho” de te mostrar um apartamento. A má qualidade do atendimento é meio regra geral aqui: é raro encontrar uma garçonete que não seja antipática, ou um comércio que tenha funcionários prestativos. Eu atribuía à cultura de independência dos alemães o fato de, por exemplo, numa loja você ter que se virar pra procurar seu tamanho de roupa ou de sapato, ou comprar um móvel em que você mesmo busca as peças na loja, carrega pra casa e depois monta. Mas tenho reparado que também tem a ver com a maneira como se encara o trabalho. A impressão que dá é que as pessoas não se preocupam em trabalhar bem, talvez por não haver tanta concorrência no mercado de trabalho, ou pelas taxas de desemprego não serem tão altas. Certamente tem também a ver com uma qualidade de vida maior, em que, em geral, se chega em casa às 5 da tarde, e muitas vezes não se trabalha às sextas-feiras. A mentalidade capitalista, definitivamente, não reina aqui: além de ninguém estar nem aí para a qualidade do serviço prestado e se o cliente vai ou não voltar, o comércio aqui NUNCA abre aos domingos, fecha, em geral, às 20h o mais tardar e, comumente, não funciona às quartas, além de alguns fazerem uma pausa diária para a siesta! Aqui não existe mercado ou qualquer outra coisa 24 horas, nem entrega em casa, nem serviço em domicílio, nem funcionário para fazer por você qualquer coisa que você possa fazer sozinho! A exceção é para o comércio ou para funcionários estrangeiros, estes sim super simpáticos e muitas vezes com horários menos germânicos. Aliás, os estrangeiros, como eu disse em outro post, parecem maioria aqui. São vistos por todas as partes, muitos abrem comércio, são empregados em todos os setores da economia alemã, parece que trabalham bem melhor e, não à toa, são “importados” de todo o mundo para fortalecer a economia e a academia alemã. Aos poucos começamos a entender esse estímulo do governo alemão para a vinda de estrangeiros (a bolsa do Marco é um exemplo). No meu curso atual de alemão, todos os professores, sem exceção, são estrangeiros! E são incrivelmente melhores que a senhorinha germânica da outra escola. Ah, a língua alemã merece um post à parte! Mas funciona igualzinho: aparentemente super precisa e organizada – tem uma palavra pra cada exato sentido (por exemplo, ir ou se perder à pé ou ir ou se perder de carro), mas tem palavras iguais para sentidos muito diferentes (por exemplo: andar e correr, namorado e amigo – tudo bem que esta diferença também não existe em inglês, mas vamos combinar que o alemão é uma língua beeeeeem mais complexa, com muito mais palavras). Fora a ordem das coisas na frase: em muitas construções é preciso dar todas as informações (sujeito, tempo, causa, modo, local) para, no final, às vezes de uma frase enorme, vir o verbo, que traz a idéia principal! Ou seja, você só diz ou só entende o sentido no final. Mas apesar de ser uma língua difícil, eu tenho adorado estudar alemão e sinto muita pena de agora encerrar o curso, pra viajar um pouco e depois me organizar pro mestrado, que começa em setembro. Agora, um ponto positivo da desconstrução dos estereótipos do alemão foi a surpresa de vê-los festivos, animados e muitas vezes tão espontâneos quanto a gente. Nos bondes, as conversas são tantas e tão altas, que chega a ser bem barulhento, ao contrário da discrição e da contenção que imaginávamos. E, apesar dos serviços, em geral, funcionarem mal, temos encontrado algumas pessoas extremamente simpáticas e prestativas. No verão, então, as ruas são uma festa, com mil eventos rolando, pessoas animadas, bebendo e curtindo a vida. Os fins de semana parecem um pouco o nosso carnaval, com festivais, gente fantasiada e muitos noivos, em despedida de solteiro, fazendo brincadeiras e abordando pessoas nas ruas, um barato. Em Heidelberg, fomos “atacados” por um grupo de moças querendo cortar a etiqueta da cueca do Marco! É claro que contribuímos para a tarefa da despedida de solteira, mas eu fiz questão de ajudar a localizar o objeto de desejo das meninas!

sábado, 9 de julho de 2011

Anotações

-impressionante a quantidade de estrangeiros na Alemanha e em Karlsruhe. Já não me chama atenção escutar diversas línguas no bonde: italiano, espanhol, português, inglês (em geral com sotaque americano), grego, russo... A comunidade brasileira de Karlsruhe é enorme e não é incomum ouvir samba, ver capoeira ou avistar uma bandeira do Brasil por aí. O que mais me surpreende são as mulheres árabes, algumas cobertas da cabeça aos pés, outras apenas com o lenço na cabeça, muitas delas modernas e estilosas, fazendo compras, academia, dirigindo, andando com outras mulheres que não usam o véu. Tenho a impressão que Karlsruhe tem mais estrangeiros que alemães. Parece que esta presença maciça de imigrantes tem a ver com a necessidade de mão-de-obra, carência tanto da Alemanha pós-guerra quanto de hoje, com densidade demográfica decrescente. Por isso, o estímulo (ou a não coerção mais agressiva) da imigração. Outro aspecto que permite essa maior tolerância com os estrangeiros é a herança cultural da Alemanha pós-nazismo, que faz de tudo para se afirmar como um país pacífico, que acolhe as diferenças e respeita a comunidade internacional. Apesar de muitos brasileiros se queixarem de preconceito, eu sinto que ser estrangeira aqui é a coisa mais natural do mundo.

minha turma de alemão ilustra bem as diversas origens dos estrangeiros aqui: Macedônia, México, China, Canadá, Itália, Coreia, Colômbia, Líbia, Síria, Rússia...


- já falei da nudez, mas a naturalidade com que os alemães lidam com ela continua me surpreendendo. Acho interessante não haver nenhuma questão em se estar nu, sem qualquer sexualização ou desconforto. Na academia, as moças (e as velhas, mesmo as muito gordas), além de fazerem sauna e de andarem para lá e para cá peladonas no enorme vestiário, tomam banho de sol no terraço, que é exposto para a cidade inteira! E parece não haver nada mais natural do que deitar pelada numa espreguiçadeira com mil janelas em volta. Realmente acredito que a vizinhança fique absolutamente indiferente, pois aqui ninguém parece estar preocupado em olhar para ninguém, esteja nu, bêbado fazendo baderna, fantasiado ou vestindo trajes exóticos. Tem sido libertador o exercício de deixar a vaidade de lado, não me preocupar tanto com o que eu visto, ou como me comporto, mas acho que estar nua na presença de alguém não vai se tornar algo natural... 


-as bicicletas aqui são tão respeitadas que os carros raramente as ultrapassam. O ciclista simplesmente indica com o braço se vai entrar numa rua e os carros é que parem. Parece que há um planejamento governamental para tornar a vida dos motoristas cada vez mais insuportável. Então os Strassenbahns, os pedestres e as bicicletas têm sempre prioridade no trânsito, ampliam-se as áreas restritas a carros, cobra-se caríssimo para estacionar e disponibiliza-se poucas vagas. A proposta é excelente, até porque o transporte público funciona maravilhosamente bem. É possível prever o itinerário completo pela internet, colocando-se origem, destino e horário desejado de chegada ou de partida. Sabe-se exatamente em que horário o bonde passa em cada estação e na maioria delas tem até um painel eletrônico com a previsão de horário de chegada de cada linha. Só para ilustrar como tudo aqui é mais bem planejado: Karlsruhe não é uma cidade muito grande e já está em obras para o metrô porque a previsão é de que daqui a 10 anos a malha viária atual não vá dar conta do movimento crescente!